Rio - Nas semanas anteriores à sua morte, na quarta-feira, a vítima de uma colisão entre o ônibus do BRT em que estava e um carro que invadiu a pista seletiva, Eliana Almeida de Carvalho, de 57 anos, prestava assistência a uma vizinha, também vítima de acidente na pista do BRT. A colega foi atropelada, quando descia do ônibus, por uma moto que invadiu a faixa seletiva. Eliana foi sepultada na manhã desta sexta-feira, no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap. Já a vizinha Ana Selma Reis está em casa, com uma perna amputada.
"Minha esposa e eu estávamos cuidando dela e, há 15 dias, levamos quatro cestas básicas para ela. Pouco depois, a vítima era minha esposa. Mais uma trabalhadora a sofrer neste transporte indigno e humilhante do Rio. O ônibus estava lotado, como sempre, e tombou com a batida, causando a morte dela", disse o porteiro José Ricardo de Carvalho, de 54 anos, viúvo de Eliana, que também deixa três filhas e três netos.
O sepultamento de Eliana é marcado por um tom de protesto. Familiares e amigos empunham cartazes com dizeres como "Pedimos às autoridades mais fiscalização e punição aos infratores de trânsito" e "Até quando, prefeitura? Mais uma vida perdida". Em outro, se lê "Mais uma família destruída", ao lado de um desenho de um ônibus do BRT.
"O povo trabalhador está abandonado pelo poder público. E é obrigado a sofrer dentro dessas latas velhas e superlotadas todos os dias. A gente só queria um transporte digno para ir trabalhar e voltar para casa com tranquilidade, e poder descansar para o ganha pão do dia seguinte", desabafou José Ricardo.
Eliana de Carvalho, moradora de Campo Grande, trabalhava como servente em uma escola particular no Recreio dos Bandeirantes. Após completar dois anos de serviço, ela pretendia voltar a trabalhar em casa, em uma creche improvisada no quintal, onde cuidava das crianças da vizinhança.
"Ela não suportava mais o desgaste nos ônibus. Eram três conduções todos os dias e cerca de duas horas e meia nessas carroças precárias que temos na cidade. Por que fiscalizam as aglomerações em bares e restaurantes e não nos ônibus? Por que os trabalhadores têm que sofrer do jeito que sofrem?", questiona José Ricardo.
"Infelizmente, hoje é minha tia que morre. Amanhã será outra família a sofrer com a precariedade do nosso transporte. No dia seguinte à morte dela, um amigo mandou foto com o BRT lotado em Santa Cruz e com as duas portas abertas. Para cair alguém e morrer, não custa", disse Cristina Almeida de Carvalho, de 37 anos, sobrinha de Eliana.