Rio - "A gente trabalha ativando as memórias das crianças, por isso precisa ser acolhedor, humanizado". É dessa forma que o Inspetor Emerson Brant resume a atuação de quem se dedica a investigar crimes de violência sexual contra crianças e adolescentes. Ele é um dos instrutores do Curso de Capacitação em Depoimento Especial de Crianças e Adolescentes vítimas ou testemunhas (CCDE), da Polícia Civil, que formou, nesta quarta-feira, agentes neste tipo de atendimento especializado.
Psicólogo de formação, Emerson trabalha da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (DCAV) há 20 anos e pontua que é importante preparar os agentes porque o ato de colher informações em um caso de violência sexual não é uma simples conversa. O policial precisa estar atento às reações emocionais, à qualidade do discurso, para direcionar a memória.
"A gente não faz entrevista, eu vou facilitar a lembrança para a criança ativar a memória do que aconteceu, se aconteceu, com uma técnica. Assim eu consigo saber o que aconteceu e como aconteceu. Se eu fizer perguntas, como uma entrevista, eu não vou saber", explica Emerson Brant, que continua: "É uma diferença sutil para ver se a criança/adolescente está mentindo ou não. Não nos cabe julgar. É uma entrevista humanizada, respeitando o íntimo e o emocional, com cuidado para não revitimizar".
Neste mês, o governador Cláudio Castro anunciou um investimento de R$ 690 mil em 22 salas que serão preparadas para atender especificamente esse público, que precisa de atendimento especializado e acolhedor num momento tão difícil. O valor será usado em cada uma das 14 Delegacias de Atendimento à Mulher (DEAMs) e nas delegacias de Seropédica, Mesquita, Nilópolis, Itatiaia, Teresópolis e Iguaba. Já a Delegacia da Criança e Adolescente Vítima (DCAV) contará com duas salas.
"Isso é muito importante para quem está sendo preparado, para futuramente, quando elas estiverem funcionando, uma criança chegar à delegacia você se sentir preparado para atender. Vai dar uma tremedeira, mas não vai deixar que o trabalho se perca", completou o psicólogo.
Grande procura pelos agentes
O Curso de Capacitação em Depoimento Especial de Crianças e Adolescentes vítimas ou testemunhas (CCDE) acontece com regularidade desde 2018, mas este ano, pela primeira vez, aconteceu na modalidade a distância por causa da pandemia causada pelo novo coronavírus. Outra novidade foi a inclusão de investigação simulada ao final do curso.
Segundo o Delegado Carlos Eduardo de Araújo Rangel, Diretor de Ensino da Acadepol, a procura pelo curso é muito grande, por atender a uma demanda dos gestores e de toda classe policial. Inclusive, nessa edição, há a presença de Delegados e agentes das polícias civis de outros estados (Acre, Mato Grosso e Pará).
"O curso possibilita que o policial passe a alterar sua metodologia de atendimento às crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de crimes. O método PEACE, utilizado pela polícia civil do RJ, é uma modalidade de entrevista cognitiva que nos foi repassada pela polícia do Canadá e nós fizemos as adaptações metodológicas à realidade processual penal brasileira. O ganho é gigantesco, pois a criança e o adolescente recebem um atendimento humanizado e, por outro lado, a polícia produz um elemento de prova mais consistente", comentou o delegado.