Mais um ataque com indícios de intolerância religiosa foi registrado no Rio de Janeiro. Desta vez, a vítima foi a empreendedora Maria Enoia de Souza, de 51 anos, sacerdotisa do Candomblé e Catimbó, conhecida como Mãe Enoia, que teve sua barraca de venda de acarajé, localizada no bairro Bananal, em Ponta Negra, distrito de Maricá, incendiada por criminosos.
O caso aconteceu no dia 16 de fevereiro e só agora foi divulgado. Além de sofrer com o ataque, a vítima ainda diz ter sofrido constrangimento ao tentar registrar o caso na 82ª DP (Maricá). "Até mesmo quando eu fui fazer a o boletim de ocorrência no dia que atearam fogo. Não souberam me receber, me disseram que eu tinha que pagar uma taxa de R$ 700,00 a R$ 800,00 para fazer a perícia, e como eu não tinha esse dinheiro, então eu tinha que fazer esse boletim online", conta a comerciante, que só conseguiu registrar o caso no último deia 2.
Até o fechamento desta matéria a Polícia Civil na havia dado resposta sobre o tratamento recebido na delegacia pela empreendedora.
As investigações estão sendo acompanhadas pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), que está prestando orientações à Mãe Enoia. "Não cabe mais tanta violência, destruir o instrumento de trabalho de um cidadão é repugnante, se torna mais sério ainda quando carrega uma simbologia atrelada ao segmento afro religioso", diz o Babalawô Ivanir dos Santos, representante da CCIR.
A Barraca do Acarajé foi inaugurada em novembro do ano passado, às margens da RJ-118 (Ponta Negra-Jaconé) mas, após denúncias e ameaças de despejo, transferida para um tereno particular, cedido por um amigo da empreendedora. Desde a inauguração, porém, Mãe Enoia vinha sofrendo pressões e ameaças motivadas por intolerância religiosa. Em dezembro, criminosos danificaram a estrutura da barraca e roubaram a lona que a cobria, seguida de uma denúncia à prefeitura, que a obrigou a mudar de localização. Até que, na madrugada do dia 16 de fevereiro, os criminosos atearam fogo à barraca, destruindo tudo o que havia em seu interior, como utensílios de cozinha com o tachos e panelas; além de fogão, geladeira, mantimentos e material descartável que era usado para servis os clientes.
Um dos indícios de ataque motivado por intolerância religiosa foi o fato de os recipientes de azeite de dendê, um dos ingredientes principais da gastronomia afro-brasileira, terem sido retirados da geladeira e deixados vazios, jogados ao redor da área incendiada, indicando que o material foi também usado para atear fogo ao local.
"É muito difícil você estar no espaço onde aconteceu o crime, como aconteceu, que pra mim, aquilo lá foi um crime. Você perde as suas coisas e você não tem um órgão pra te amparar. É muito difícil. Não queira estar no meu lugar”, desabafa a empreendedora, que agora conta a com ajuda de amigos e clientes e doações para tentar reativar seu negócio.
O caso gerou comoção. "As baianas de acarajé sofrem na pele a intolerância religiosa, mesmo fazendo do seu ofício o trabalho que sustenta suas famílias, elas são discriminadas, sofremos desde a legalização do tabuleiro à venda do acarajé. A ABAM/RJ está ciente do caso e amparando para a prefeitura de Maricá valorizar e ser consciente do ofício das baianas de acarajé e seu reconhecimento como patrimônio imaterial”, disse Rosa Perdigão, coordenadora da Associação das Baianas de Acarajé do Rio de Janeiro(Abam/RJ).