Amanheceu

Por Gabriel Chalita Professor e escritor

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Era anivers�rio de Guilherme. Acordou ele antes do hor�rio. Nem sabe a raz�o. Havia dormido tarde, mas acordou cedo, muito cedo.

Resolveu n�o brigar com a aus�ncia de sono e deu a noite por dormida. E abriu as janelas. E viu a lua. Imensa. Cheia. Repleta de mist�rios. Inspiradora. Ficou ali no parapeito, apenas em �xtase. Parecia um presente para o dia do seu anivers�rio.

Alguns barulhos de dentro da casa desviaram sua aten��o. Foi estar com os seus. Recebeu abra�os. Mas a janela o chamava de volta. Imaginava ele os que dormiam e desperdi�avam esse espet�culo. Queria dizer ao mundo: "Parem de brigar e vejam a lua!". E, de repente, o sol veio surgindo timidamente. E a lua sem pressa de partir. Juntos ali. Vez em quando, isso acontece. Sem disputas. Cada um compreendendo o seu papel.

Guilherme gosta de rabiscar poemas. Quem gosta de faz�-los precisa gostar de observar. Paisagens e pessoas. Sentimentos.

Pensou ele nos anos que se passaram. Nas hist�rias tristes que, um dia, ocuparam seu dia. Nos rompantes de raiva que passaram. Nos ditos dos quais se arrependeu. Pensou nas conquistas. Meu Deus, foram tantas! Decidiu que o dia do anivers�rio n�o era um dia de pedir. Era um dia de agradecer. E agradeceu. Foi se lembrando dos idos anos de mocidade. E agradeceu. Da fam�lia, e agradeceu. Da escolha profissional. Tamb�m agradeceu. Lembrou-se de sua mulher amada que morreu antes do dia certo. O certo seria, neste dia, ela estar com ele. N�o dependeu dele nem a doen�a nem a partida. Agradeceu por ter cuidado dela at� o fim.

Agradeceu os sofrimentos. Fizeram-no mais consciente de sua fragilidade. Houve tempos em que se achava senhor de tudo. N�o. Ningu�m �. Ningu�m tem todo o poder em suas m�os. Ningu�m est� imune ao erro, � falta, � injusti�a, � dor.

Naquele amanhecer de lua cheia, Guilherme n�o sentia dor alguma. A idade traz algumas complica��es. Mas estava feliz. Decididamente, feliz. Mais um ano chegava e dava a ele a oportunidade de contemplar e de fazer. Lembrou, com algumas l�grimas nos olhos, dos pais que j� se foram. Eram bons. Essencialmente bons.

A algazarra da cozinha, com Dona Silvia preparando o bolo, roubou dele um sorriso. "Que cheiro bom, cheiro de anivers�rio!".

Arrumou-se de felicidade e foi se encontrar com o dia.

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Gabriel Chalita, colunista do DIA Divulga��o

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