Viol�ncia mata dez torcedores por ano

Botafoguense � a 177� v�tima fatal desde 1999 no pa�s. Dos outros sete feridos, um est� em estado grave

Por O Dia

Rio - O pa�s do futebol, reconhecido mundialmente pelo talento dos atletas com a bola nos p�s, � tamb�m o que mais produz v�timas fatais de viol�ncia entre as torcidas organizadas. A morte do botafoguense Diego Silva dos Santos, de 28 anos, do lado de fora do Engenh�o no domingo, foi a de n�mero 177 nos �ltimos 17 anos, uma m�dia de mais de 10 mortes por ano.

Se considerarmos que h� poucos jogos nos meses de dezembro e janeiro, � praticamente uma morte a cada m�s. �Entra ano, sai ano e o problema continua sem solu��o. Falta planejamento, organiza��o, interesse e responsabilidade das autoridades para resolver esta quest�o�, aponta o soci�logo Maur�cio Murad, professor da Universidade Salgado de Oliveira. Os n�meros est�o no seu rec�m-lan�ado livro �A Viol�ncia do Futebol: novas pesquisas, novas ideias, novas propostas�.

Moradores encontraram ontem resqu�cios da �guerra� de domingoDaniel Castelo Branco / Ag�ncia O Dia

Dois outros torcedores feridos no confronto de domingo continuam internados no Hospital Salgado Filho, no M�ier. Anderson Firmo da Silva, integrante da Torcida Jovem do Botafogo, foi operado e continua em estado grave. J� Evanildo Fernandes n�o corre risco de perder a vida. Outros cinco torcedores feridos no cl�ssico foram liberados ainda na noite de domingo.

Ontem, familiares de Diego negaram que ele fizesse parte de torcidas organizadas, o que foi desmentido por diversas fotos que circularam nas redes sociais mostrando que o torcedor era integrante da F�ria Jovem, uma das maiores fac��es alvinegras. Em seu perfil no Facebook, Diego fazia v�rias postagens de apologia � viol�ncia entre torcidas, bem como a Deus, Jesus Cristo e � fam�lia. Na p�gina oficial no Facebook, a F�ria Jovem referiu-se a Diego como �amigo que se foi�, e disse �nenhum sangue ser� derramado em v�o�. A morte do torcedor teve requintes de crueldade, com golpes de espeto de churrasco no tronco e no rosto.

A diretoria da F�ria Jovem reclamou da aus�ncia de policiais na partida e disse que os torcedores foram v�timas dos rubro-negros, que teriam invadido o espa�o destinado aos alvinegros portanto paus, pedras e armas de fogo. Em nota oficial, a PM admitiu que a crise na corpora��o por conta de protestos das mulheres de policiais prejudicou o policiamento. A Pol�cia Civil informou que a Delegacia de Homic�dios investiga a morte do torcedor e j� recolheu c�meras para tentar identificar os suspeitos do crime. H� relatos de que o tiro que matou Diego partiu de ocupantes de um carro que passava pelo local.

Diego foi morto ap�s ser baleado em confus�o na porta do Engenh�o%2C antes do cl�ssico entre Botafogo e FlamengoReprodu��o Facebook

A guerra nos arredores do Engenh�o reacendeu o debate em torno da exist�ncia das torcidas organizadas. Maur�cio Murad nada contra a mar� do senso comum que, a cada caso de viol�ncia, pede a extin��o das torcidas organizadas no futebol brasileiro. �N�o resolveria nada. Temos que matar o carrapato, n�o o gado. As torcidas organizadas s�o respons�veis por festas incr�veis. Mas elas t�m 5% de idiotas, marginais, que precisam ser punidos de forma exemplar", pede Murad.

O cl�ssico de domingo � citado pelo pesquisador como um bom exemplo do que n�o se deve fazer quando o assunto � torcida organizada. Punidas por epis�dios de viol�ncia, as principais torcidas organizadas do Flamengo n�o puderam entrar no est�dio uniformizadas, com bandeiras, faixas e instrumentos musicais. Nada disso impediu a barb�rie do lado de fora.

�Se voc� regulamenta a torcida e identifica o torcedor, fica mais f�cil punir. No est�dio, ele est� engaiolado. E filmado. Na clandestinidade, fora do est�dio, o marginal produz ainda mais viol�ncia. Desde 1990, 90% dos epis�dios de viol�ncia ocorrem foram dos est�dios. Mas ningu�m se d� conta disso. Punindo as torcidas, e n�o os bandidos, voc� prejudica o espet�culo, que perde a festa, e n�o diminiu a viol�ncia�, alerta.

As solu��es para o problema, segundo Murad, n�o s�o simples. � preciso vontade pol�tica das autoridades e participa��o efetiva dos clubes neste processo, com o fim de subs�dios aos grupos de torcedores.

Familiares negam que Diego pertencesse a torcida organizada%2C mas postagens em redes sociais refutamEstefan Radovicz / Ag�ncia O Dia

�Ultimamente, os clubes falam em distanciamento das torcidas organizadas, mas sabemos que por baixo dos panos ainda h� subs�dio em ingressos ou viagens. Isto precisa ser revisto, e os dirigentes, punidos�, diz.

Dos quatro grandes clubes do Rio, apenas o Flamengo admitiu ajuda �s torcidas, que precisam se inscrever no programa de S�cio Torcedor Corporativo do clube, tendo direito a 50% de desconto no ingresso e garantia da carga que desejarem. Fluminense, Vasco e Botafogo garantiram que n�o possuem mais rela��es comerciais com as torcidas.

Dia seguinte: cen�rio de p�s-guerra

Buracos de bala na parede, c�psulas de bala no ch�o e sangue seco manchando o asfalto. O cen�rio de ontem no entorno do Engenh�o ainda expunha as marcas dos momentos de guerra do dia anterior. Nos estabelecimentos das redondezas, n�o se falava de futebol.

Dono de padaria na Rua Jos� dos Reis, Gabriel Fernando Cabral, de 21 anos, teve de fechar as portas antes da hora no domingo. �Muitos torcedores do Botafogo ficaram ilhados aqui. Nunca vi nada parecido. Virou um mar de briga�, conta.

Al�m dos tiros, houve relatos de roubos. �Em dia de jogo, a gente v� aquelas brigas �normais�. O que aconteceu ontem foi vandalismo. N�o acho que seja coisa de futebol�, comenta a moradora Joice dos Santos, de 68 anos.

No acesso ao Setor Oeste, o pequeno Victor Michel, de 6 anos, encontrou a c�psula de uma bala enquanto brincava na tarde de ontem. J� a cobradora Maria Aparecida, de 60, presenciou a cenas mais chocante do domingo: a morte de Diego sendo perfurado por um espeto de churrasco. �Foi horr�vel�, contou a moradora.

Plano inicial era reduzido

A Pol�cia Militar confirmou que uma parte do Grupamento Especial de Policiamento em Est�dios (Gepe) encontrou dificuldade para sair do quartel at� o Engenh�o por causa do protesto de parentes na porta do 3�BPM (M�ier) e que foi necess�rio chamar policiais de outras unidades.

O planejamento inicial, informado pela Pol�cia Militar, era de 48 PMs nas ruas do entorno do est�dio, um n�mero inferior ao cl�ssico anterior, que foi de 70 agentes. No entanto, o Gepe escalou 170 PMs para a partida � 20 a mais que no jogo entre Vasco e Fluminense.

Moradora da Rua Jos� dos Reis h� 24 anos%2C Joice dos Santos viu as cenas de barb�rie e sofreu com g�s Daniel Castelo Branco / Ag�ncia O Dia

� �TV Globo�, o diretor de competi��es da Federa��o de Futebol do Rio de Janeiro, Marcelo Vianna, afirmou que a pol�cia n�o conseguiu fazer a troca de turno. �O 3� BPM n�o conseguiu fazer a rendi��o de seu efetivo, n�o fez a troca de turno. Por conta disso, o Estado-Maior Geral da Pol�cia Militar teve que trazer policiais de outras unidades e demorou mais para se conseguir um n�mero suficiente de PMs para o entorno do est�dio�, disse.

Colaboraram Bruna Fantti e o estagi�rio Caio Sartori

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